VOTAÇÃO DO CONCURSO DE CONTOS "Eu Rio"
Apresentamos o conto "Eu Rio", da autora Alice Paiva Souto (adulta)
Leia aqui o conto na íntegra. Para votar, é só curtí-lo Eu Rio no Facebook
(infelizmente curtidas em páginas compartilhadas não poderão ser contabilizadas)
Leia aqui o conto na íntegra. Para votar, é só curtí-lo Eu Rio no Facebook
(infelizmente curtidas em páginas compartilhadas não poderão ser contabilizadas)
Eu
rio!
O
Rio de Janeiro continua lindo. Mas o aluguel vai aumentar no mês que vem. "Tudo
sobe nessa cidade, menos o meu saldo bancário. O que eu vou fazer?" Ia
pensando Catarina enquanto caminha pelas ruas de Botafogo em busca de um novo
apartamento para morar. Mas talvez a melhor opção fosse mesmo voltar para casa
dos pais no interior. Mil experiências de cidade e nada nas mãos. Terá sido
tudo uma ilusão? Para Catarina era difícil a decisão.
Há
muito tempo já morava no Rio. Desde os 19 anos, quando chegou para estudar em
uma escola de artes cênicas famosa por formar os futuros atores Globais. O
sonho televisivo foi substituído pelo amor ao teatro de rua, e lá se foram os
anos em ensaios, apresentações e editais. Há dez anos morava nessa cidade. Há
dez anos namorava o Rio. Uma história de amor. Mas no momento, às vésperas do
seu aniversário de trinta anos já sentia essa relação meio abalada.
Tudo
nessa cidade agora lhe lembra Pedro, seu namorado. Pedro é a cara do Rio. Dizia
umas coisas tão bonitas tipo “amar é um elo entre o azul e o amarelo”, fazia
trocadilhos muito engraçados... Pedro a ensinou um monte de coisas sobre
liberdade. Um homem feminista, se dizia, desde que começara a faculdade de
ciências sociais. Seu cigarro apertado por uma folha de seda que era um
sucesso. Metido com política, frequentava reuniões longuíssimas. Diziam que era
poeta.
Mas
ontem a noite havia sido a gota d’água. Não aguentava mais espera-lo chegar
tarde da noite com cara cheia de cerveja e ávido por comida, "de
larica", como dizia. Eram incontáveis as reuniões de um certo comitê que
aconteciam em um bar na praça São Salvador. Pedro dizia que ela não precisava
preparar o rango quando chegasse em casa, mas Catarina não ia deixar o garoto
com fome. Era só ele chegar para a moça lhe preparar mais um prato de uma louça
que ele nunca lavava. E se ela reclamasse disso ele ainda a chamava a neurótica
e citava Freud.
Mas
ontem, para piorar, ele ainda aparecera cheio de purpurina. "Mas porque
purpurina se ainda não é Carnaval?" E, enciumada, pensou que Pedro pudesse
ter ficado com uma daquelas moças que rodam bambolê na praça. Já não sabia se
podia confiar nele. Uma de suas amigas lhe havia dito que Pedro era um homem
típico da zona sul, uma espécie conhecida como "esquerdo-macho". Mas
que saudades daquela barba quando a beijava...
Inquieta,
Catarina caminhava pelas ruas da cidade em busca de sinais para sua decisão.
Ela era a sacerdotisa de um secreto oráculo de frases nas ruas cujas fotos
todos os dias publicava em um perfil do instagram chamado #poemuros. “Pra onde
corro?”, foi as frases de hoje. Muito adequada a sua presente situação...
Cabisbaixa,
avistou outro sinal. No que parecia ser um bueiro viu escrito: "Luz/Força".
Era tudo quer precisava naquele momento! Mas na verdade, aquela era a tampa do
sistema elétrico que apesar dos bonitos dizeres lhe trazia a recordação
bastante sombria da morte de sua amiga do teatro, vítima de uma explosão. Só no
Rio de Janeiro bueiros são também campos minados prestes a explodir em qualquer
momento. Como confiar em seu namorado em uma cidade onde não se pode confiar
nem na lei da gravidade? Onde não se pode confiar nem que os tampos de bueiros
vão permanecer no chão? Foi quando avistou a frase: "A vida é curta para
se pequena", escrita em mais um muro a tinta, e sentiu que era preciso
seguir o seu caminho.
Resolveu
correr para a Glória, onde havia oferta de um quarto para alugar em um
apartamento. Resolveu ir de metro e lá chegando ocorreu uma situação engraçada.
Avistou três avisos "sem saída!" mas viu algumas pessoas subindo as
escadas ignorando tais sinais. Catarina refletiu sobre seu momento de vida,
pois também se sentia "sem saída", mas resolveu acreditar naquelas
pessoas ali subindo. E não é que tinha saída? Subindo a rua Benjamin Constant,
Catarina começou a se sentir melhor, achando boa a perspectiva de viver em um
bairro com um nome tão significativo. "É a Glória!" Nesse momento,
viu escrito no muro a frase: "Antes arte do que nunca" e se lembrou
dos momentos bonitos que viveu em apresentações de teatro na rua e como seria
difícil deixar essa cidade.
Chegando
no apartamento, uma república, na verdade, conheceu aqueles que seriam seus
futuros colegas de casa. Eram todos artistas na mesma situação que ela. Lhe
disseram que tudo ficaria bem pois estavam no sopé de Santa Tereza, que era a
padroeira dos artistas. O valor do quarto também era bem mais barato que seu
aluguel de conjugado em Botafogo. E aproveitando que era uma quarta-feira, a
convidaram para conhecer a roda de choro da Rua do Fialho. No caminho, ainda
avistou um pequeno lambe lambe colado em um muro escrito "Mais amor por
favor" e isso aconteceu no mesmo momento em que recebeu uma mensagem no
celular de Pedro escrito: "Por que rimar amor com dor?/ O amor tece".
Por
estar distraída olhando o celular acabou esbarrando sem querer em uma jovem e viu
seu corpo coberto de purpurina e teve convicção que provavelmente teria sido
isso que havia acontecido com Pedro. Afinal de contar, no Rio a purpurina é uma
constante, está em toda parte sem nem precisar ser Carnaval. E é essa é só uma
das coisas que torna essa cidade tão especial! Então ela o convidou para o
chorinho e Catarina reatou o namoro com Pedro e a cidade do Rio de Janeiro.